sábado, 13 de setembro de 2008

O relógio de ouro - Machado de Assis

“O Relógio de Ouro”

A história se trata do enigma do aparecimento de um relógio no quarto de Clarinha, esposa de Luís Negreiros. Este lhe pergunta sobre o surgimento daquele relógio em seu quarto. Clarinha nega saber, o que faz o marido ficar desconfiado e irritado, por não ter conhecimento da origem daquele objeto e por perceber que a única que poderia lhe dizer a verdade seria sua esposa. Negreiros aparenta desconfiar de uma traição de Clarinha. Há, também, certa preocupação por parte de Clarinha quanto ao relógio: “...os olhos apenas, porque o pensamento, não tenho certeza, se estava no livro ou em outra parte.”
Acontece a visita do pai de Clarinha à casa de sua filha e genro, o mesmo desconfia de algo diferente estar acontecendo entre os dois: “Estavam de arrufos (mau humor passageiro)... é o que há de ser” disse Sr. Meireles.
Era o aniversário de Luís Negreiros. Por um momento ele pensou que o relógio poderia ser um presente de aniversário da esposa, mas não era. Negreiros fica ainda mais nervoso e intrigado.
O marido, já enraivada disse: “Responde, demônio, ou morre!” Então, a esposa lhe mostra uma carta, entregue pelo portador da casa e disse que o mesmo foi até o escritório de Luís Negreiros, mas não o havia encontrado lá. Luís Negreiros lê a carta que dizia: “Meu nhonhô. Sei que amanhã fazes anos: mando-te esta lembrança. Tua Iaiá”.
Machado de Assis usa de ironia ao iniciar este conto onde escreve: “Agora contarei a história do relógio de ouro”, a história, na verdade, não é sobre o relógio de ouro e sim sobre um conflito no relacionamento de um casal. E ainda ousa finalizar o conto escrevendo: “Assim acabou a história do relógio de ouro”,o conto não tem um final, o jogo de culpa acontece a todo o momento, não se sabe ao certo quem traiu ou mesmo se houve de fato uma traição. Machado brinca com isto.
O conto é narrado na terceira pessoa do singular. Percebe-se a voz do narrador em diversas partes do texto, que narra e ao mesmo tempo esclarece fatos ao leitor: “Por este motivo, e outros que são óbvios, compreenderá o leitor...”; identidade entre personagem e narrador. A todo tempo, o narrador guia o leitor.
A narrativa deste conto é mais curta e mais concreta, se comparada à fase anterior de Machado de Assis, quando escreveu “Miss Dólar”, onde a narrativa é longa e imprecisa.
Os nomes dos personagens são muito sugestivos. Luis Negreiros, nome e sobrenome, possivelmente alguém importante, de classe superior. Clarinha, diminutivo, nome de pessoa simples, de classe inferior. Senhor Meireles, o narrador enfatiza o senhor, chefe de família, provavelmente de classe inferior também, por este personagem é introduzido um tom de humor. O nome de Clarinha e de Negreiros também sugerem aspectos do conto onde hora os fatos são claros (nome Clarinha) e hora são ocultos, escuros, negros (nome Negreiros). No campo da literatura, o nome próprio tem um papel importante a considerar. O artista nomeia os personagens da maneira como o faz, mais, ou menos, intencional. Em Machado de Assis, o antropônimo atribuído a um personagem desempenha uma função específica, não devendo ser visto como mero instrumento de identificação do ser.
Machado de Assis usa o relógio, um simples objeto, para investigar o comportamento social. Feridas da sociedade como o casamento em busca de benefícios para o pai (apesar de no caso desta história, a moça ter se agradado do rapaz), diferença de classe social e possível traição, implícita, são trabalhados neste conto.
Utiliza-se de linguagem pura, adequada entre o instrumento verbal e o pensamento do escritor. É marcadamente acadêmica: clássica, bem cuidada, regida pelas normas de correção gramatical. Entretanto, em alguns pontos, ele registra aspectos típicos da língua da personagem, como nesta fala de Sr. Meireles: “... ó seu malandrim!”.
Percebe-se também nesta obra a presença do fato real e do fato imaginário. Há elementos que existem na vida real e também existem na literatura, porém na literatura esta articulação é organizada. Mesmo não podendo ter totalmente fundamento, observa-se que um serve de contexto para o outro. Na obra, o fictício abre o espaço para o imaginário do próprio personagem que abre ao leitor um novo imaginário a partir do imaginário do personagem, que não deixa de ser uma ficção. Daí vem as denúncias implícitas de Machado sobre a realidade da sociedade de sua época, no caso deste conto o adultério.
Por fim, pode-se dizer que O Relógio de Ouro não tem um final definido. Ao leitor resta a possibilidade de conviver com o não resolvido, com o fato de não poder conhecer a totalidade de algum personagem.
Diante de características de Machado de Assis observadas neste conto, não se pode deixar de falar da “maturidade” dos textos de Machado na época em que este conto foi escrito. Foi em 1873, em Histórias da Meia Noite, que o conto O Relógio de Ouro foi publicado. Neste período, ainda se escrevia com traços do Romantismo, mas no caso deste conto, as características já eram realistas. Machado de Assis foi um instrumento na transição do Romantismo para o Realismo. De acordo com Antônio Cândido “O realismo, aliás, é de todo o romance, em todas as suas fases, pois o romance constitui-se sobretudo na medida em que o aceitou, como alimento da imaginação criadora, o cotidiano e a descrição objetiva da vida social.” Todos os romances tem características do Realismo, pois a partir da realidade, do cotidiano, vem a ficção. Foi neste modo de pensar que Machado transitou para o Realismo. Machado de Assis contista está no mesmo nível do romancista, inclusive a evolução é a mesma: de romântico ele passará a realista.
A partir daí o escritor preocupa-se muito mais com a análise das personagens do que com a ação. Por isso, em suas narrativas, pouca coisa "acontece": há poucos fatos em suas histórias, e todos são ligados entre si por reflexões profundas, características do Realismo.
A visão de mundo machadiana tem as seguintes características: humor, este tem duas funções: ora visa criticar o ser humano e suas fraquezas, através da ironia, ora demonstra compaixão pelo homem, fazendo o leitor refletir sobre a condição humana; pessimismo, não o angustiado nem desesperador. Machado de Assis apresenta ainda, segundo Antônio Cândido aspectos bifrontes: “Ironista ameno e cronista do absurdo”. São dois aspectos presentes em um mesmo escritor que aparentemente se confrontariam, mas eles se integram um ao outro se tornando um estilo predominante nas obras de Machado. O tempo todo faz ironias mas não vulgarmente e sim com amenidade, leveza. Desconsolado quer dizer desacreditado; cronista, aquele que escreve fatos do dia a dia, da atualidade, coisas pertinentes à época; absurdo, algo fora da normalidade, do comum. Suas crônicas são atuais até hoje, pois remetem a reflexões profundas de fatos cotidianos, com base naquilo que observava com ironia e quase sempre a mesma traz, implícita ou explicitamente, uma advertência.
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Referência Bibliográfica

·
www.cce.ufsc.br/literatura/relogio.html
· ASSIS, Machado. Clássicos da nossa língua. Companhia Editora Nacional. 2003
·
www.suapesquisa.com/realismo
· www.wikipedia.org

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